O blog do Pedro Martinelli tá linkado no meu, foi nele que li a recomendação. Fui conferir e com devida autorização, reproduzo por aqui emaranhando ainda mais a rede. O texto em homenagem ao dia dos fotógrafos é muito divertido e quem tá nesse outro emaranhado também vai reconhecer uns personagens para a classificação da menina. A menina? Mônica Canejo. O blog dela? http://www.umamulherdevestido.blogspot.com/. Os textos aí em baixo...
Texto1:
"08 de janeiro: Dia do Fotógrafo
No início de 1996, pela primeira vez fui apresentada a um fotógrafo. Foi uma apresentação que coincidiu com minhas primeiras aulas de fotografia na faculdade. O que eu não sabia é que, daí por diante, não me livraria mais deles. Trabalhando, estudando, viajando, conversando, namorando, tuitando... eu já perdi a conta de quantos conheci: são catorze anos de convivência ininterrupta. Então acho que estou habilitada a falar sobre as minhas impressões sobre eles. Vou começar pelos mais chatos (prometo que depois falo dos legais)."
Texto2:
"Dia do Fotógrafo: 'Os Cotoveleiros'
De todos os fotógrafos que conheci, os piores, para mim, são os 'Cotoveleiros'. Incrível, eles parecem ter mais cotovelos do que olhos! Em qualquer evento, vão empurrando todo mundo com os braços abertos, como galinhas chamando os pintinhos pra debaixo da asa. Quase sempre têm também uma bolsa enorme, que balançam de um lado para outro para afastar os concorrentes. Estão sempre desesperados para conseguir um lugar melhor, para fazer uma foto melhor, para fazer o registro único num local nem um pouco exclusivo. Acho que nunca passou pela cabeça deles a palavra ‘cooperação’. O que os torna mais patéticos é que, na maioria das vezes, fazem esta cena desnecessariamente. E preocupam-se tanto em concorrer com os colegas que não percebem o que realmente está se passando. Uma vez, cobrindo um Agrishow Ribeirão, levei várias cotoveladas de um cara que queria fotografar o presidente Lula. Ia empurrando todo mundo e dizendo que era do "O Globo". Mas a verdade é que o Lula, que ainda não tinha decepcionado muita gente, ficou um bom tempo no palco, fazendo pose para as lentes. Ele é quem tinha chegado atrasado. Só conseguiu fotografar dona Marisa, na saída, conversando com um palhaço (palhaço mesmo, de cara pintada e nariz vermelho) que estava fazendo não sei o que naquela cena. O pior é que, no ano seguinte, lá estava ele de novo (o fotógrafo, não o palhaço). Com uma mochila gigante e um novo item no equipamento: uma escada. Eu disse: uma es-ca-da! Para quem não sabe, o Agrishow Ribeirão Preto é maior feira de agronegócios da América Latina, um evento realmente grande, mas bem organizado, com horários marcados, discursos programados e acesso absolutamente livre para a imprensa, com dezenas de computadores a disposição e cominhos caprichados, com sucos, refrigerantes, saladas, massas e queijos cremosos com geléia de framboesa (um luxo). Sem contar os shows e os jantares nos melhores restaurantes da cidade, exclusivo para jornalistas (ô saudade!). E eu pergunto: para que o desespero? Para que passar na frente dos outros? Para que a pressa? E o que ele ia fazer com uma escada num local onde não havia necessidade de se ver de cima?Aliás, para ver de cima mesmo, fotógrafos tinham direito a vôos panôramicos de helicóptero. É sério. E se ele não abria mão disto, bastava usar uma mesinha ou pedir uma escada, com certeza não faltaria. Desta vez ele estava fotografando o infame Severino Cavalcanti, que na época era presidente da Câmara. Falou umas bobeiras, abraçou uma criancinha com síndrome de Down e foi solenemente ignorado pela imprensa. Se alguém fez foto dele, foi só pra constar. Quando acabou o discurso, o fotógrafo cotoveleiro parecia mais tranquilo. E me deu umas olhadas, meio em jeito de flerte (até que ele era ajeitado, sabe?). Como sou boa fisionomista, reconheci na hora o cotovelador do ano anterior. E passei direto, fingindo que não tinha notado a existência dele. Porque simplesmente não dá pra levar a sério alguém que vai do Rio de Janeiro a Ribeirão Preto carregando uma escada nas costas."
Texto 3:
"Dia do Fotógrafo: outros estereótipos
OS OBCECADOS. Alguns são pelo equipamento. Mal ouviram falar de um lançamento com um 0,0001 mp a mais e já estão atrás da BH fazendo sua encomenda. Me lembro de um que tinha sempre a Cannon mais nova, com duas dúzias de lentes. E um dia ele mesmo confessou que não sabia para que tudo aquilo, se na época o que ele estava fazendo era o passo a passo pra uma revista de ‘ponto em cruz’. Outros são obcecados pela própria fotografia. Não falam outra coisa. Conheci um rapaz que estava começando a fotografar. Era namorado de uma amiga do meu namorado. Nos encontrávamos em festas de amigos em comum e passávamos a noite toda ‘conversando’. Na verdade, ninguém tinha paciência com o rapaz: ele até era gente boa, mas só falava de fotografia. Então meu namorado, que era fotógrafo, saía de fininho. A namorada dele também. E restava a mim, pessoa tolerante e generosa, ouvir o moçoilo monologar durante horas sobre todas as suas reflexões, dúvidas e pretensões com relação ao seu único assunto. Alguns anos depois, nos encontramos casualmente numa livraria e ele me contou que estava namorando uma bailarina. Me surpreendi de ouvi-lo pela primeira vez falar de outro assunto. Aí a conversa foi indo até ele contar que, então, agora estava fotogrando balé. Pois é.
OS ANGUSTIADOS: às vezes, a angústia é com a fotografia. Eles olham, olham... E pensam que poderia ter ficado melhor, que não souberam aproveitar bem a ocasião, que o editor não soube escolher, que a impressão ficou ruim... Outros se angustiam com a relação do fotógrafo com o objeto fotografado. O rapaz vai lá numa comunidadezinha distante e volta se sentindo um ladrão de almas, perguntando a si mesmo e ao resto do mundo qual foi a contrapartida social deste trabalho. Acham que podem usar a fotografia para mudar o mundo. Mas, no fundo, não usam. Apenas se angustiam. Outras já extrapolam: estão angustiados é com a vida mesmo. Fazem da fotografia sua forma de expressão porque precisam muito expressar seu próprio “eu”, sabe? Ok! Eles costumam ser pessoas do bem! Mas, cá entre nós, prefiro os mais felizes.
Também não tenho muita paciência com os MENINOS PRODÍGIOS. São criativos, ousados, antenados. Mas geralmente tem uma empáfia! Compreendo bem que alguém que já tem fama de bom profissional antes de completar 30 anos fique um pouco deslumbrado. Mas me lembro que, não sei quando nem onde, o Pedro Martinelli disse que só se considerou fotógrafo depois de 10 anos de profissão. Acredito que tenha mais relação com a postura que se adquire com a experiência do que com o resultado técnico-estético das fotos. O bom é que os jovens talentos, com o tempo, vão percebendo que há mais coisas entre a câmara escura e o fundo infinito do que julga sua vã sabedoria. E vão se tornando pessoas menos arrogantes e, portanto, mais simpáticas e interessantes (talvez por isto os meus preferidos sejam os mais velhos)."
Texto 4:
"Dia do Fotógrafo: O Lobo Mau
Há também o fotógrafo LOBO MAU. Costumam aparecer em eventos discretos, como palestras e shows para poucas pessoas. Chegam mais paramentados do que padre em missa da semana santa. Colete de homem bomba, bolsas grandiosas, a câmera já na mão. E uma lente enorme. Fico pensando: o que é que ele está enquadrando com esta lente, assim tão de perto? Está tentando contar quantos cílios a cantora tem no olho esquerdo? Procurando uma marquinha de catapora? Me dá vontade de chegar pertinho e perguntar com vozinha de Chapeuzinho Vermelho: - Mas vovóóó... pra que uma lente tããão grande?"
Texto 5:
"Dia do Fotógrafo: Tralhas
Tem também os fotógrafos que negam o flash. Não usam porque acham que a luz que está é a luz que deve ser usada. Alguns têm discursos bacanas. Outros pecam um pouco. Mas eu conheci um, gente boníssima e excelente profissional, numa viagem pelo Jequitinhonha, que dizia que até usou flash por um tempo mas não gostou. Preferia fazer as fotos com a luz que estava presente na cena. Imaginei que ele era um ‘purista’, apegado à luz natural. Então, na hora de sair para ir fotografar umas pessoas, ele pegou suas tralhas. Bolsa com as câmeras e lentes, tripé e... uma gigantesca luminária de luz contínua. Pois é, ele não usava flash, mas viajava carregando um monte de equipamento de estúdio. O engraçado foi na hora de ir embora, quando ele pegou o onibusinho que ia de Chapada do Norte para Diamantina. Foi preciso mobilizar todos os recém amigos – todos fotógrafos- para ajudá-lo com a bagagem. Compridas bolsas, lotadas de tripés e lâmpadas e etecéteras. Mais bagagem para uma semana do que eu levo para um mês. Por falar em bagagem, é outro item curioso com relação a fotógrafos. Carregam tanta coisa! Conheço um que levava a fralda da filha (de pano e limpa, claro). E outro que não saía de casa sem levar vários livros, várias revistas, mapas e uma infinidade de outras coisas que era óbvio que ele não ia ter tempo de usar. E outro que, numa viagem a trabalho, foi barrado pela segurança do aeroporto na hora de passar pelo raio x. Porque além da câmera e de todas as lentes, filmes, filtros, flashes, caixinhas e caixonas, ele tinha na bagagem de mão duas chaves de fenda e dois estiletes. Mas não eram duas chavinhas de fenda, daquelas de relojoeiro, boas para emergências com o equipamento. Eram duas chaves enormes! E dois estiletes enormes (e por que dois?)! Ainda bem que estava no Brasil, porque em qualquer outro lugar ia ser difícil convencer que não era um terrorista ('Não, não...eu não vou fazer a comissária de refém, 'insh Allá' a minha barba caia se eu fizer algum mal com esta chave de fenda de meio metro. E, pelas virgens do profeta, esta é apenas minha coleção de estiletes, não são adagas!')."
Texto 6:
"Dia do Fotógrafo: os preferidos
Há os professores. Têm sempre alguma coisa pra dizer. Não que eles achem que sabem mais: eles, de fato, sabem mais. Não sei dizer o que, mas é alguma coisa que escapa à percepção das outras pessoas e que eles pescam rapidamente. O melhor é que compartilham. E vale ponhar reparo no que eles dizem, costumam estar certos. Além deles, os meus ‘preferidos’ são os mais velhos. Alguns aprenderam a fotografar em câmeras que nem tinham fotômetro. E agora estão aí, debruçados nos computadores, mexendo em programas de tratamento de imagem da mesma forma que aprenderam a medir a luz ‘no olho’. Não só testemunharam como fizeram parte efetivamente das mudanças qeu a fotografia vem passando nas últimas décadas. E nunca se aposentam: estão sempre fazendo alguma coisa nova. É como se os equipamentos ficassem obsoletos, mas eles não. Tem um ditado que diz que cachorro velho não aprende truque novo. Fotógrafos aprendem. Mantêm um perene interesse em aprender. E têm sempre tantas coisas pra contar que sou capaz de conter minha tagarelice e ficar só ouvindo, por horas, encantada com o que eles podem ensinar. Também já perderam o deslumbramento dos mais jovens, mas não perderam a paixão. Aliás, todo fotógrafo - e agora eu não estou generalizando a esmo, é fato - é um apaixonado. Nunca conheci um que tivesse entrado na profissão só porque era vontade da família ou porque passou num concurso da prefeitura. Do fotodocumentarista que se embrenha por meses na floresta amazônica querendo pegar malária ao fotógrafo de casamento que chama suas clientes bonitinhamente de ‘minhas noivinhas’. Eles amam fotografar, dá para perceber só pelo jeito com que seguram as câmeras. E, quando em ação, têm um brilho nos olhos que até confunde quem está por perto. Alguns são tímidos, inseguros. Outros são espalhafatosos, exibicionistas. Uns são rústicos. Outros sofisticados. Mas nenhum é ‘morno’. É esta intensidade indisfarçável que os torna tão atraentes e, até, populares (ou vocês já viram algum protagonista de cinema que era despachante? Mas, fotógrafos, de “Blow Up” a “Antes da chuva”, tem mais de uma dúzia de filmes). Talvez eu seja suspeita (sim, eu sou absolutamente suspeita) para dizer, mas eles costumam ser apaixonantes. Me lembrei disto quando li no blog do Ayrton (http://ayrton.com/360/) a descrição do dia em que o helicóptero caiu na favela .... ele contando como ficou sabendo, da correria, da emoção. Pronto, me apaixonei pelo Ayrton! E por todos os fotojornalistas de novo. Tá, eu prometi para minhas irmãs e amigas que nunca mais vou namorar um fotógrafo. Estou cumprindo a promessa. Mas, gostar deles eu posso, não é? Eu simplesmente não consigo deixar de admirá-los. No fundo, acho que até os cotoveleiros, quando não estão cotovelando ninguém, devem ser interessantes (hum... talvez eu devesse ter dado uma chance pro cara da escada...). Então, é isto: feliz ‘dia dos fotógrafos’!"
Fonte: Blog da Mônica Canejo - http://www.umamulherdevestido.blogspot.com/
Fernanda Torres em Inocência
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Foto de Pedro Farkas. Fernanda Torres no filme Inocência. Brasil, 1983.
Há 20 horas
3 comentários:
Baita texto da Monica! Vale a pena o emaranhado!
Adorei os textos da Monica. Vou lá conhecer o blog dela.
Me vi em vários fotógrafos no texto da Monica. Principalmente no dos velhos apaixonados..
Nauro Júnior
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